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#Contos#Literatura Brasileira

Americanas

Por Machado de Assis (1870)

— Já o sabia, suspirou a doente.

— Não digo que tudo esteja perdido, continuou o médico, mas nada se perde em prevenir.

— Então...

— Coragem!

— Fale.

— Mande chamar o padre.

— Aconselha-me a confissão?

— É indispensável.

— Perderam-se todas as esperanças?

— Todas. Confissão e banhos.

A viúva soltou uma risada.

— E banhos?

— Banhos de igreja.

Outra risada.

— Aconselha-me então o casamento.

— Justo.

— Imagino que está gracejando.

— Estou falando muito sério. O remédio não é novo nem desprezível. Todas as semanas lá vão muitos enfermos, e dão-se bem alguns deles. É um específico inventado desde muitos séculos e que provavelmente só acabará no último dia do mundo. Pela minha parte nada mais tenho que fazer.

Quando a viuvinha menos esperava, Avelar levantou-se e saiu. Falava sério ou gracejava? Dois dias se passaram sem que o médico voltasse. A doente estava triste; a tia aflita; houve idéia de mandar chamar outro médico. Recusou-a a doente. — Então só um médico acertou com a tua moléstia?

— Talvez.

No fim de três dias recebeu a viúva Lemos uma carta do médico.

Abriu-a.

Dizia assim:

É absolutamente impossível esconder por mais tempo o que sinto por V. Excia. Amo-a. Sua moléstia precisa de uma última receita, verdadeiro remédio para quem ama — sim, porque V. Excia. também me ama. Que razão obrigaria a negá-lo?

Se a sua resposta for afirmativa haverá mais dois entes felizes neste mundo. Se negativa...

Adeus!

A carta foi lida com explosão de entusiasmo; o médico foi chamado a toda a pressa, para receber e dar saúde. Casaram-se os dois daí a quarenta dias.

Tal é a história da Última receita.

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