Capital linguístico
Segundo Pierre Bourdieu, em Economia das Trocas Linguísticas (1991), o capital linguístico é a acumulação de um conjunto de competências e recursos linguísticos que um indivíduo possui, incluindo conhecimento de uma língua específica, a sua forma de falar e a capacidade de usar essa linguagem de forma eficaz em diferentes contextos. Tal como o capital econômico e o capital social, o capital linguístico - que é uma forma de capital cultural - é uma ferramenta de poder e mobilidade social. A posse e o domínio de competências linguísticas específicas (o capital linguístico) conferem uma posição social, permitindo o acesso a recursos e oportunidades.
O capital linguístico opera num mercado linguístico, onde as diferentes competências linguísticas são valorizadas ou desvalorizadas dependendo do campo social. O capital linguístico determina a posição do falante nesse mercado, influenciando suas chances de sucesso em diferentes contextos sociais. A linguagem "de prestígio" ou "do dominador" tem um valor que permite a conversão em capital econômico ou social. Bourdieu identifica três tipos de mercados linguísticos:
- Mercado livre: situações informais onde variedades populares podem ter maior valor
- Mercado protegido: contextos formais controlados por normas institucionais
- Mercado oficial: espaços estatais onde apenas a variedade "legítima" é aceita
A hierarquização das variedades linguísticas decorre do habitus linguístico, um conjunto de disposições linguísticas internalizadas que orientam as práticas de fala dos indivíduos. O habitus linguístico é adquirido de forma inconsciente, principalmente durante a socialização primária na família e posteriormente na escola. Os falantes internalizam não apenas formas linguísticas, mas também juízos de valor sobre diferentes maneiras de falar. Uma vez incorporado, o habitus linguístico tende a ser durável, influenciando as escolhas linguísticas ao longo da vida. Isso explica por que mudanças no status socioeconômico nem sempre resultam em mudanças imediatas nos padrões linguísticos.
O habitus linguístico funciona como mecanismo de reprodução das desigualdades sociais. Indivíduos de classes populares, com habitus linguístico não-padrão, encontram dificuldades em contextos que valorizam o capital linguístico dominante. A relação entre capital linguístico e habitus produz o fenômeno da "violência simbólica linguística":
- Reconhecimento da legitimidade: falantes de variedades não-padrão reconhecem a superioridade da norma dominante
- Autocensura: desenvolvem sentimentos de inadequação linguística em contextos formais
- Reprodução da dominação: contribuem inconscientemente para manter as hierarquias linguísticas existentes
O conceito de capital linguístico de Bourdieu é fundamental para compreender como o preconceito linguístico opera não apenas como questão individual, mas como mecanismo estrutural de dominação social que se perpetua através do habitus incorporado pelos agentes sociais.